Pendular, os olhos vagueiam pelo piso, o encardido do rodapé. Os olhos resistem em se afastar da obscenidade dessa morte, e uma massa marrom gosmenta amorfa se escancara, ri, no canto perto da pia. Pensar, ter essa morte na saliva, na rugosidade do palato, nos mesmos olhos que umedecem a comida podre, podre e esquecida, podre e abandonada. Súbito o chão parece um imundo intolerável. Pensa vou limpar, lavar, esfregar. Mas, não se move, porque teria de enfrentar aquela podridão desconhecida, talvez tocá-la, retirá-la de algum modo do chão, sua viscosidade periclitante, seu aspecto borrachudo e mórbido. Limpar, lavar, esfregar, arrancar com as unhas todas as manchas e gorduras, toda comida que deixou de ser despejada na privada. Limpar até que as paredes retornem ao branco e o piso, luminoso, sorria o reflexo. Mas, é a morte que sorri, magnânima, na primeira fuga do pensamento. No instante em que se esquece do alvejante, percebe que continua a fitar a comida podre no chão, sobrevivente, despercebida, resquício de matéria que esvanece sem cumprir sua missão da língua ao intestino. E como aquela massa, sem nome nem forma, agora, neste lapso do pensamento, causa enjoo tão violento do estômago à garganta. Corre até o banheiro e afasta as lágrimas ao pensar na morte que sorri na água suja.
ÚnicaLinha #5 - sobras e restos
ÚnicaLinha #5 - sobras e restos
ÚnicaLinha #5 - sobras e restos
Pendular, os olhos vagueiam pelo piso, o encardido do rodapé. Os olhos resistem em se afastar da obscenidade dessa morte, e uma massa marrom gosmenta amorfa se escancara, ri, no canto perto da pia. Pensar, ter essa morte na saliva, na rugosidade do palato, nos mesmos olhos que umedecem a comida podre, podre e esquecida, podre e abandonada. Súbito o chão parece um imundo intolerável. Pensa vou limpar, lavar, esfregar. Mas, não se move, porque teria de enfrentar aquela podridão desconhecida, talvez tocá-la, retirá-la de algum modo do chão, sua viscosidade periclitante, seu aspecto borrachudo e mórbido. Limpar, lavar, esfregar, arrancar com as unhas todas as manchas e gorduras, toda comida que deixou de ser despejada na privada. Limpar até que as paredes retornem ao branco e o piso, luminoso, sorria o reflexo. Mas, é a morte que sorri, magnânima, na primeira fuga do pensamento. No instante em que se esquece do alvejante, percebe que continua a fitar a comida podre no chão, sobrevivente, despercebida, resquício de matéria que esvanece sem cumprir sua missão da língua ao intestino. E como aquela massa, sem nome nem forma, agora, neste lapso do pensamento, causa enjoo tão violento do estômago à garganta. Corre até o banheiro e afasta as lágrimas ao pensar na morte que sorri na água suja.